Triste Trópico de Arthur Omar — o anti-documentário por excelência
O filme de 1974 concretiza a ideia de anti-espetáculo proposta pelo artista
O filme Triste Trópico (1974) de Arthur Omar busca questionar os valores de um tipo de cinema. O "falso documentário" narra a trajetória de um médico nos anos 1920 que, após uma temporada na França, embrenha-se no interior do Brasil para pesquisar remédios e curas pelas tradições populares e indígenas.
Omar aborda a tentativa que o documentário faz de retratar a realidade, a utopia em (tentar) reportar certo aspecto da 'cultura', na medida em que o filme é parte dessa mesma cultura. Para o autor, portanto, o documentário nada mais é que uma ‘ficção real’, já que ‘só se documenta aquilo de que não se participa’.
Aparentemente, o filme é construído como um documentário. Há um narrador em off que apresenta e contextualiza o filme ao explicar a trajetória de vida de Arthur Nogueira e que fornece informações além do que aparece nas imagens. Porém, em 1925, quando o personagem chega ao Brasil, aos poucos podemos perceber que o caráter do filme começa a oscilar entre o esquema documental e ficcional que estamos acostumados.
O narrador cita que o personagem conviveu com Renoir, Picasso e Breton, a trilha sonora, as fotos, as ilustrações e os vídeos remetem a uma atmosfera surrealista, com elementos próprios da realidade brasileira do início do século XX, momento da chegada do personagem no Brasil.
Por outro lado, o filme apresenta um tom profético e se desenvolve ao ponto de descolar as imagens da narração, da 'voz de deus'.
Ou seja, o filme se apresenta como espetáculo, que se ‘constrói a partir da combinação livre de seus elementos’ e se deixa ‘fecundar pelo tema’, constituindo-se assim, um anti-espetáculo e não como um espetáculo, pois tira o espectador da posição passiva de quem aguarda o conhecimento de um objeto exposto como ocorre um um documentário tradicional.